sexta-feira, 13 de julho de 2007

Mude sua percepção

Modelos mentais podem atrapalhar sua vida, deixe-os de lado pelo menos por alguns instantes.

Nossos modelos mentais têm duas polaridades: os modelos em si e a nossa percepção deles. Nossa resposta à experiência depende em grande medida de "em que” e “como” estamos prestando atenção. Por exemplo, considere uma pessoa viajando de carro e que está na metade do caminho de mil quilômetros. Ela tem lá seu modelinho mental do que está acontecendo: o propósito da viagem, quem está indo, a estrada, sua posição nesta, lembranças do que já aconteceu e expectativas de acontecimentos futuros e possivelmente outros. Se essa pessoa está enfatizando na sua percepção o que está faltando para chegar, reage de um jeito. Se enfatizar o que já andou, pode ficar até feliz porque já andou "bastante". A situação em si não mudou, o que fica diferente é a forma de percebê-la. Ela poderia também nem estar prestando atenção no andamento da viagem, e portanto não fazendo julgamentos; simplesmente poderia estar buscando coisas bonitas na paisagem, conversando e aí ela "nem vê o tempo passar".

Assim, certas coisas só existem para nós se prestarmos atenção nelas, e de uma certa maneira. Um dia um amigo meu se lembrou que, quando seu pai morreu, estavam todos sentados na sala após o enterro, com parentes e amigos, aquele clima. A certa altura, alguém contou uma piada, e muitos riram; por alguns momentos, esqueceram os acontecimentos e a atenção ficou só na piada, ou seja, no modelo mental dela.

Isso se aplica a certos tipos de problemas. Podemos ter um, mas estar fazendo algo tão interessante que nos esquecemos dele. Ou podemos prestar tanta atenção nele que, assim o nutrindo, ele "cresce" e nos incomoda até que seja resolvido. Na verdade, a própria visão do problema como um problema decorre do modelo mental que estamos adotando, incluídas aí as intenções. Um carro com defeito é um problema para o dono do carro, mas é oportunidade de faturamento para o mecânico. Para o dono pode ser uma oportunidade de descobrir uma boa oficina. E se a oficina não for tão boa, o fato pode ser considerado um aprendizado. Tudo depende das opções disponíveis ou geradas pelos modelos mentais em uso. Conhecer melhor como funciona nossa inteligência em termos dos pólos “percepção-modelos mentais” abre duas frentes ou linhas de expansão da inteligência: modificar os modelos mentais ou alterar a forma como os percebemos. Aqui, neste texto, investigamos algumas oportunidades da segunda opção. Para isso, descrevemos algumas variáveis perceptivas e ações possíveis associadas a cada uma. Como a percepção é algo que acontece no presente, momento-a-momento, é possível alterarmos instantaneamente nossa resposta aos modelos mentais simplesmente mudando o que estamos prestando atenção, através de ações perceptivas.

Essas ações são coisas que todos nascemos sabendo fazer e efetivamente as fazemos a todo momento, mas para você não achar que é fácil demais e talvez até desprezar estas opções, no final descrevemos também algumas interferências que podem ocorrer. Na PNL, chamamos a isso de metaprogramas de atenção.

Note que as sugestões fazem sentido somente se você estiver buscando algo, se estiver insatisfeito ou quer que algo fique diferente, por qualquer motivo que lhe seja importante. Ou seja, aquelas coisas que fazem com que nos mexamos.

Amplitude de segmento

Imagine que você está fazendo um roteiro para uma viagem grande, passando por várias cidades. Há duas percepções básicas possíveis para essa situação. Primeiro, imagine a viagem como um todo, uma só escolha. Agora, considere que você vai viajar por etapas, e suponha também que em cada etapa tem algo interessante para ser visto e feito. Há diferenças em como você reage à viagem?

Essa é uma capacidade interessante: podemos perceber o todo ou cada parte, as partes formando o todo, partes das partes e por aí vai. O mais interessante é que temos controle sobre o que prestamos atenção.

Na verdade, fazemos essas variações todo o tempo. Podemos estar percebendo uma pessoa como um todo ou só seu comportamento atual. Você pode ouvir uma música e avaliar o todo ou aspectos: voz, arranjo, melodia. Se quiser, pode focar sua atenção em um instrumento apenas. Essa variável da percepção é chamada de amplitude de segmento.

Aplicações envolvendo a amplitude de segmento

Podemos variar a amplitude de segmento de duas maneiras básicas: de mais ampla para mais específica ou segmentada e de mais específica para mais ampla ou genérica. Não há regra para o que é melhor, isso vai depender da situação e do propósito. Veja algumas inspirações e sugestões de aplicação dessa idéia.

- Você está sentindo uma dor localizada. Expanda a amplitude de segmento para todo o corpo, para perceber também as partes que não estão doendo.

- Você está com uma impressão de uma pessoa, assim como uma opinião negativa. Expanda a amplitude de segmento para enxergar mais aspectos do seu modelo mental dela: o que sabe que ela já viveu, o papel dela em sua vida, experiências legais que teve com ela, circunstâncias presentes do ocorrido, possíveis motivos para ações suas e dela.

- Se você está reagindo a algum acontecimento específico, e no seu modelo o que aconteceu está representado como "erro" ou "fracasso", expanda sua percepção para o "conjunto da sua obra": todos os acertos de sua existência, por exemplo, ou só em contextos semelhantes.

- Isto serve também para coisas "chatas": Se você tem que ir ao supermercado e não gosta disto, expanda sua amplitude para uma maior faixa de tempo, para poder perceber há quanto tempo ou de quanto em quanto tempo vai. Tem coisas chatas que fazemos apenas uma vez por ano, o que pode ser bastante tolerável quando percebido dessa forma.

- Uma das aplicações mais curiosas que se faz com a amplitude de segmento é tornar as pessoas mais "bonitas". Muitas vezes avaliamos um rosto pelo todo, segundo um padrão; reduzir a amplitude da percepção revela belezas antes insuspeitas. Olhe somente os olhos ou a boca da pessoa. Experimente andar na rua olhando só olhos ou bocas.

- Para perceber estímulos corporais, temos vários tipos de receptores nervosos, como para tato, pressão, calor, frio e dor. Podemos perceber os estímulos como um todo ou, já que são separados dessa forma, percebê-los um de cada vez.

Posição perceptiva

Você está aí agora, vendo com seus próprios olhos, ouvindo com seus próprios ouvidos. Esta é a chamada primeira posição perceptiva, o seu próprio ponto de vista. Só que não é a única, e muitas vezes adotamos outras sem sequer ter consciência disso.

Por exemplo, certas tribos de índios tem em sua cultura o hábito de trocar os calçados em uma conversa. Há instrutores que fazem isso em treinamentos. A intenção é estimular a percepção da situação com os olhos do outro, a segunda posição. E quando está mais para um observador neutro, percebendo um contexto de uma posição dissociada, então está em terceira posição. Em terceira posição você se vê no "filme", e vê também os outros envolvidos.

Experimente cada posição: lembre-se de uma situação com outra pessoa. Lembrou-se? Reveja a situação do seu próprio ponto de vista, o que estava vendo, ouvindo e sentindo (não precisa fazer rápido, dê-se tempo). Depois, entre na pele do outro e veja o que ele estava vendo, ouvindo e possivelmente sentindo. Agora, reveja a situação como alguém não envolvido, vendo aqueles dois interagindo.

As pessoas comumente rotuladas de "egoístas" ou "egocêntricas" tendem a ver as coisas somente pela sua posição perceptiva. O que é importante é "o que eu quero ou gosto", "meus objetivos", "minhas necessidades". Uma pessoa abnegada demais, no entanto, pode perceber predominantemente as pessoas em segunda posição.

Uma evidência sensorial de que você adota a segunda posição é quando alguém lhe conta um caso e você tem reações físicas. Tem gente que, ao assistir o Globo Repórter com um documentário sobre escaladores de prédios sentem frios na barriga a cada minuto.


Aplicações

- Se você acha que está pensando muito em si, pratique entrar em segunda com alguém que considera importante para você. Se quiser praticar brincando, não precisa ser uma pessoa, pode ser um bicho ou até um objeto.

- Ver na posição perceptiva de um bicho pode ser útil.

- Experimente fazer de conta que é um leão faminto ou uma cobra e veja o que acontece.

- Colocar-se no lugar de crianças pode ensejar melhores atitudes.

- Todo líder, a meu ver, necessariamente tem que acessar diferentes posições perceptivas: dos superiores, dos subordinados, dos clientes e a própria.


Interferências

Parece fácil, não? Estou com um problema, mudo minha percepção e - plim! - a mágica acontece. Na prática, a facilidade depende muito da sua consciência e flexibilidade em relação aos seus modelos mentais, que influenciam e conduzem sua percepção de três maneiras. A primeira é pelo hábito; podemos estar condicionados a prestar atenção em certas coisas, como defeitos, cabelos amarelos ou olhos verdes. A segunda é por habilidades. Quem está muito treinado em algo, como malabarismo ou direção de automóveis, tem um ciclo de atenção organizado e tão ágil que pode até fazer outras coisas em paralelo. A principal diferença entre habilidade e hábito é o grau de escolha que a pessoa tem, na primeira em geral há muitas opções e no hábito quase não as há. A terceira é o reflexo: diante de certos estímulos, a atenção é conduzida sem qualquer possibilidade de escolha, como no caso de fobias, e o prestar atenção inicia um "programa mental" sem escapatória.

Existe uma quarta forma de se conduzir a atenção: a escolha consciente. Você, por exemplo, pode escolher prestar atenção em qualquer coisa que esteja no seu campo visual e auditivo ou ainda nas suas sensações, isso é facilmente verificável. É sobre esta opção que vimos falando. A principal interferência que você pode ter ao buscar fazer escolhas perceptivas são os hábitos ou reflexos perceptivos. Se você não tem prática com isso, haverá, como em qualquer aprendizado de habilidades, uma fase de transição e uma defasagem natural entre a decisão de iniciar o processo e atingir maior fluência e efetividade.

Com ou sem interferências, estando atento, presente e com opções, você pode alterar suas percepções e assim mudar o que está experimentando. As opções estão neste texto e nas dicas que damos, mas quem decide é você!

Baseado em texto de Virgilio Vasconcelos Vilela

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